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Venezuela: a crônica de uma destruição deliberada

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Imigrantes venezuelanos cruzam fronteira rumo à Colômbia: 9 em cada 10 venezuelanos estão na pobreza (Foto: Carlos Eduardo Ramirez/Reuters)  

Era uma vez um país muito rico. Esse país tinha uma bênção e uma maldição. A bênção eram reservas aparentemente inesgotáveis de petróleo. A maldição era uma elite corrupta que mantinha o povo distante da prosperidade. Cansados, os habitantes renderam-se ao discurso sedutor de um militar populista, que se elegeu presidente prometendo redistribuir as riquezas. Prometeu, mas não cumpriu. Tornou-se um ditador, intervindo no parlamento e no judiciário. Governou até morrer e foi sucedido por um seguidor que mantém as mesmas práticas e é tão corrupto quanto as elites anteriores.

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O parágrafo anterior parece uma fábula, mas é uma descrição muito resumida de quase três décadas da história venezuelana. Desde 1998, com a eleição do coronel Hugo Chávez (1954-2013), a economia da Venezuela perdeu o prumo. Chávez assumiu o poder com a promessa de transformar a Venezuela em uma nação socialista – ou em seu jargão, “bolivariana”, em alusão ao general Simon Bolívar (1783-1830). Sua plataforma eleitoral se baseava na redistribuição da riqueza e na intervenção estatal na economia.

Inicialmente, o militar usou os vastos recursos petrolíferos do país para financiar programas sociais, o que resultou em melhorias significativas nos indicadores de pobreza e desigualdade. No entanto, a dependência excessiva do petróleo criou vulnerabilidades econômicas, especialmente devido às oscilações de preços da commodity.

Chávez morreu em 2013 aos 58 nos, vítima de um câncer, e foi sucedido pelo vice-presidente, o sindicalista Nicolás Maduro. Condutor de metrô em Caracas, Maduro governou com poderes especiais desde então. Em 2018 foi eleito para um mandato de seis anos em uma eleição contestada. E foi reeleito no domingo (28) em um pleito novamente questionado pela oposição e sem transparência. Crise política à parte, sua continuidade no cargo manterá os problemas econômicos venezuelanos.

Intervenção estatal

Ainda no século passado, Chávez implementou políticas de controle de preços e nacionalizou empresas privadas para além do estratégico setor do petróleo. A estatização incluiu eletricidade, telecomunicações e siderurgia. Essas nacionalizações, em muitos casos, levaram à queda da produtividade e da eficiência, devido à má gestão e à corrupção generalizada, com resultados desastrosos.

Os números, apesar da escassez de estatísticas confiáveis, mostram isso. Segundo o economista Pedro Afonso Gomez, presidente do Conselho Regional de Economia (Corecon) de São Paulo, em 2013 um em cada três venezuelanos poderia ser considerado pobre. “Em 2021, essa proporção havia crescido para nove em cada dez pessoas”, diz ele. “A pobreza extrema cresceu de 11% em 2013 para 68% em 2023.”

A intervenção estatal e o uso da petrolífera PDVSA para funções sociais teve um impacto muito ruim na economia. Maior empresa venezuelana e uma das principais petrolíferas do mundo, a companhia chegou a ser usada para importar e vender eletrodomésticos. Não por acaso, o Produto Interno Bruto (PIB) da Venezuela recuou 62% entre 2013 e 2023. “O PIB caiu de US$ 258 bilhões para US$ 97 bilhões em dez anos”, diz Gomes.

O auge da crise ocorreu em 2018. O governo imprimiu muito dinheiro para pagar as contas, fazendo com que a inflação atingisse 63.374% segundo o portal de informações econômicas Statista.

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Inserção internacional

Como um governo se sustenta com uma situação econômica tão precária? Segundo o professor de relações internacionais Vladimir Feijó, o governo venezuelano vem se sustentando por fatores internos e externos. Começando pelo cenário externo, não há um grande defensor da queda de Maduro. “Quem teria teoricamente mais capacidade para promover uma mudança política são os Estados Unidos, por meio de pressão econômica ou mesmo poder militar”, diz Feijó.

Porém, os americanos têm problemas mais graves e urgentes, como o conflito entre Rússia e Ucrânia e as questões com a China. A Venezuela também tem um ponto a seu favor: é um grande fornecedor de petróleo, e isso reduz a disposição americana para entrar na briga.

Os vizinhos Brasil e Colômbia são os mais prejudicados devido às pressões emigratórias, mas também não estão dispostos a enfrentar os bolivarianos. A crise provocou uma diáspora venezuelana. No começo os ricos saíram do país, e muitos emigraram para o Panamá – daí a expressão “Panamazuela”.

No entanto, o agravamento da crise econômica e a escassez de comida e medicamentos levou o povo a empacotar o que sobrou e procurar lugares menos inóspitos. “Há 1,2 milhão de venezuelanos refugiados na Colômbia e cerca de 500 mil no Brasil”, diz Feijó.

O estado de Roraima tinha uma população de 500 mil pessoas e recebeu 100 mil emigrantes, o que provocou um colapso dos serviços públicos. “Nenhum governo é capaz de lidar com um aumento súbito de 20% em sua população”, afirma o professor. Porém, o país vizinho é um fornecedor importante de insumos para o agronegócio brasileiro. “A Venezuela vende fertilizantes e calcário para a correção do solo do cerrado, e isso é estratégico”, diz Feijó. Ou seja, não é possível esperar um final feliz para a fábula venezuelana no curto prazo.

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